O movimento da Escola Nova
A proposta metodológica Escola Nova surgiu
no final do século XIX, buscando defender o ensino público, gratuito, laico,
obrigatório, único, ligado a vida e ao trabalho. Porém, seus ideários são do século
XVIII, considerado século das Luzes, por conta da fértil produção das
considerados pensadores iluministas. Um período na história da educação
fortalecido pela tendência liberal e laica em que originava novos caminhos para
a aprendizagem (ARANHA, 2006).
Historiadores da educação, Aranha (2006) e
Cambi (1999) consideram este período, um momento de grandes lutas
revolucionárias para a construção de uma sociedade mais justa e democrática,
contribuindo para a emancipação humana, do sujeito com autonomia de pensar e
agir.
Soares (1996) analisa este contexto
histórico ao qual surge o projeto escolanovista. Um momento onde as ideias
liberais ganhavam evidencias no meio político e populacional, sendo confundido
como o princípio da nacionalidade ligado ao reconhecimento do direito do povo
torna-se proprietário de seu próprio destino. Outros fatos significativos dados
ao liberalismo estavam relacionados na luta pela democracia, a liberdade de
partilhar a formação do governo, combate contra o Estado Absoluto e o direito
do cidadão de eleger representantes para o Parlamento.
Apesar de existir diversos percussores que
fundamentaram o movimento da Escola Nova três autores mantém destaques na
formulação da proposta, o suíço Jean Jacques Rosseau (1712-1778), o suíço-alemão
Pestalozzi (1746-1827) e francês Emile Durkheim (1858-1917). A principal
característica da Escola Nova tem por base a criação de escolas experimentais.
Uma escola com educação integral (intelectual, moral e física); educação ativa,
educação prática, com obrigatoriedade de trabalhos manuais, exercício de
autonomia; vida no campo; internato; co-educação; ensino individualizado. Dessa
forma para que outras escolas fossem pertencentes ao movimento deveriam cumprir
no mínimo dois terços desses respectivos pontos citados anteriormente (ARANHA,
2006).
Adolphe Ferriere (1875-1960) e Édouard
Claparede (1873-1940) buscou aprofundar as críticas desses percussores exigindo
uma revolução copernicana no ensino, onde a instrução pelo verbalismo e o
intelectualismo contribuía para a passividade do aluno, concedendo assim o
aluno como um sujeito ativo. Com isto, a Escola Nova passa ser definida,
segundo Ferriere como:
uma escola
familiar, estabelecida por um campo, em que a experiência da criança serve de
base para a educação intelectual para uso adequado do trabalho manual, e para a
educação moral para uma prática de um sistema de autonomia relativa dos
estudantes (ESCUDERO apud FERRIERE, 2005, p. 33).
Entre
1900 e 1907 inicia-se o período mais fértil para formulação das teorias
relacionadas à Escola Nova, com a publicação da obra, “A escola e a Sociedade”,
em 1900 por John Dewey, considerado o fundador copernicano dos novos tempos,
suas concepções de ensino estão relacionadas ao interesse do aluno e não no
esforço em realizar as tarefas (SOARES, 1996).
Ainda hoje as percepções educacionais de
diversos precursores da Escola Nova influenciam vários autores em suas
concepções teorias metodológicas. Skovsmose é um desses autores que busca no
movimento da Escola Nova fundamentar sua filosofia da EMC.
Contudo, o movimento da Escola Nova não
foi monolítico. Ao contrário. Foi composto por diversas tendências que
convergiam para um mesmo propósito: responder aos desafios colocados pelo
avanço dos movimentos sociais, cujas demandas não poderiam ser autoritariamente
sufocadas, como o foram durante o século XIX (DORE SOARES, 1996). Os grupos
dominantes, sob a pressão do movimento popular, elaboraram uma nova proposta de
dominação que implicava fazer concessões aos governados, para obter o seu
consentimento e, assim, garantir o seu governo (DORE SOARES, 2000). É nesse
contexto que são aprovadas leis para o ensino público, gratuito, laico e
obrigatório na maioria dos países europeus, além do sufrágio universal
masculino e da permissão aos trabalhadores para formarem sindicatos e partidos.
Trata-se da ampliação da sociedade civil, nos termos de Gramsci.
Com a entrada das massas populares na
escola, pois se tornara obrigatória no fim do século XIX, os métodos existentes
para a formação educacional são colocados em xeque. Não eram adequados à
formação de trabalhadores. Mais do que isso: à escola eram atribuídos novos
papeis: preparar os trabalhadores para se inserirem numa sociedade
democrático-burguesa, com o direito de voto, de organização e de protesto (DORE
SOARES, 2000).
Num primeiro momento, com os problemas
surgidos devido às dificuldades do ensino para as massas populares, a tendência
é a de criticar a escola: sua arquitetura, seus métodos, sua organização. A
fadiga escolar, atribuída aos métodos de ensino, torna-se objeto de estudo,
como os de Claparède (1973), Binet (Apud BUYSE, 1937). Também se
criticava os novos frequentadores da escola: surgem estudos afirmando que os
filhos dos trabalhadores tinham mais dificuldades para aprender do que os
filhos da elite (DORE SOARES, 2000). Por isso, começam os estudos sobre a
inteligência. Finalmente, vem à revolução copernicana de Dewey: o problema não
estava centrado na escola, mas nos indivíduos que frequentavam a escola. Assim,
seria necessário reorganizar os métodos de ensino para o novo público, para o
contexto da industrialização. Também se fala num tipo de escola para cada tipo
de público: é a Escola sob medida de Claparède (1973).
Do movimento da escola nova, Dore Soares
(2000) destaca dois objetivos: 1) adaptar a escola às novas exigências de
formação dos trabalhadores para se inserirem na democracia burguesa e para
atender demandas da sociedade industrial; 2) obter o consentimento dos
governados ao domínio da burguesia, fazendo-lhes concessões.
Considerando-se esses objetivos, surgiu um
grande movimento, com diversas tendências, visando a mudar o tipo de formação
até então existente. Novas concepções de ensino, novas metodologias, novas
formas de pensar a organização da escola. No bojo desse movimento, são
apresentados diversos métodos nos Estados Unidos, resultantes da sistematização
de ideias de Dewey, como o Método de Projetos, de Kilpatrick (1929), além do
Plano Dalton, proposto por Helen Parkhurst (1922).
De acordo com Dore Soares (1996, 2000, 2003), o movimento da Escola Nova não foi corretamente compreendido na literatura educacional. Ele é considerado conservador ou progressista, mas não é visto como contraditório. Em sua análise, Dore Soares (1996, 2000, 2003) segue as reflexões de Gramsci sobre a educação e examina a Escola Nova como um movimento contraditório: tem elementos conservadores e progressistas. O acolhimento de muitas iniciativas advindas da escola nova, como suas críticas à educação oligárquica, muitas de suas metodologias e a sua relação com a democracia, às vezes são interpretadas como provenientes de intelectuais de esquerda. É o que ocorre com a confusão em que cai Cunha (1993), ao pensar que o Manifesto da Escola Nova de 1932 teria sido escrito por Paschoal Lemme, educador comunista, devido à proximidade da crítica à escola dualista do Manifesto e a crítica da esquerda à escola (DORE SOARES, 2003).
BUYSE, R. La experimentación en pedagogia. Buenos Aires: Labor, 1937.
CLAPARÈDE, É. A escola sob medida. ed. 3. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1973.
CUNHA, L. A. Educação e classes sociais no Manifesto de 32:
perguntas sem respostas. Revista da Faculdade de Educação da USP. São
Paulo, v. 19. n. 2. jul/dez 1993, p. 132-150.
DORE
SOARES, R. Escola nova versus escola unitária. In: Educação e Sociedade.
v. 54. p. 141-160, 1996.
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Educação).
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KILPATRICK, W. H. The
Project method: The use the purposeful act in the educative process. New
York: Theachers College, Columbia University, 1929.
PARKHURST, H. Education on
the Dalton plan. New York: P. Button & Company, 1922.
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